Pois é… as reservas indígenas brasileiras ocupam
13% do território nacional. Se depender da Funai e de alguns antropólogos do
miolo mole, chega-se a 20%. A questão não está no número em si. Poder-se-ia
destinar até 50% — desde que houvesse índios para tanto e que eles conseguissem
tirar das imensas extensões de terra que dominam ao menos o suficiente para a
sua subsistência. Mas não acontece. Não é só isso: as reservas são concedidas
na suposição — falsa como nota de R$ 3 — de que aqueles enormes vazios econômicos
em torno da comunidade são essenciais para que ela preserve sua cultura.
Procurem na Internet a poesia indianista em prosa do ministro Ayres Britto,
relator do caso Raposa Serra do Sol. Ele apelou a um índio que acabou junto com
a literatura romântica. Ainda volto a esse aspecto.
Muito bem: pesquisa Datafolha demonstra que a
maioria dos índios brasileiros está integrada às práticas próprias da vida
urbana. Uma boa parcela conta com televisão, DVD, geladeira, celular… Esse
aparato, não obstante, convive com a pobreza, razão por que quase a metade
recebe cesta básica. Isso quer dizer que eles nem plantam nem caçam o que
comem: vivem da caridade estatal — e em condições precárias.
As reservas são santuários para lustrar as
aspirações de certa antropologia mistificadora, que ainda quer mais. Leiam o
que informa Matheus Leitão na Folha. Volto depois:
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Os índios brasileiros estão integrados ao modo de vida urbano. Televisão, DVD, geladeira, fogão a gás e celulares são bens de consumo que já foram incorporados à rotina de muitas aldeias. A formação universitária é um sonho da maioria deles. Pesquisa inédita do Datafolha, encomendada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), revela esse perfil. Entre os dias 7 de junho e 11 de julho, foram realizadas 1.222 entrevistas, em 32 aldeias com cem habitantes ou mais, em todas as regiões do país.
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Os índios brasileiros estão integrados ao modo de vida urbano. Televisão, DVD, geladeira, fogão a gás e celulares são bens de consumo que já foram incorporados à rotina de muitas aldeias. A formação universitária é um sonho da maioria deles. Pesquisa inédita do Datafolha, encomendada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), revela esse perfil. Entre os dias 7 de junho e 11 de julho, foram realizadas 1.222 entrevistas, em 32 aldeias com cem habitantes ou mais, em todas as regiões do país.
Segundo a pesquisa, 63% dos índios têm televisão,
37% têm aparelho de DVD e 51%, geladeira, 66% usam o próprio fogão a gás e 36%
já ligam do próprio celular. Só 11% dos índios, no entanto, têm acesso à
internet e apenas 6% são donos de um computador. O rádio é usado por 40% dos
entrevistados. Para o Cimi (Conselho Indigenista Missionário), “é evidente que
essa novidade produz mudanças, mas isso não significa a instalação de um
conflito cultural. Não é o fato de adquirir uma TV ou portar um celular que fará
alguém ser menos indígena”.
(…)
Questionados sobre o principal problema enfrentado no Brasil, 29% dos entrevistados apontaram as dificuldades de acesso à saúde. A situação territorial ficou em segundo lugar (24%), seguida da discriminação (16%), do acesso à educação (12%) e do emprego (9%). Em relação ao principal problema enfrentado na vida pessoal, a saúde permaneceu em primeiro lugar para 30%. O emprego apareceu em segundo, com 16%, seguido de saneamento (16%). A questão territorial, nesse caso, desaparece.
(…)
Questionados sobre o principal problema enfrentado no Brasil, 29% dos entrevistados apontaram as dificuldades de acesso à saúde. A situação territorial ficou em segundo lugar (24%), seguida da discriminação (16%), do acesso à educação (12%) e do emprego (9%). Em relação ao principal problema enfrentado na vida pessoal, a saúde permaneceu em primeiro lugar para 30%. O emprego apareceu em segundo, com 16%, seguido de saneamento (16%). A questão territorial, nesse caso, desaparece.
A pesquisa mostra que o aumento de fontes de
informação tem influenciado a vida familiar dos índios: 55% conhecem e 32% usam
métodos anticoncepcionais como camisinha e pílula. Mais de 80% ouviram falar da
Aids. A maioria dos índios (67%) gostaria de ter uma formação universitária.
Apesar de ser considerado muito importante para 79% dos entrevistados, o
banheiro em casa só existe para 18% deles.
Bolsa família e cesta básica
A pesquisa sobre o perfil indígena feita pelo Datafolha, encomendada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), revela que 64% dos índios são beneficiários do Programa Bolsa Família, recebendo em média R$ 153 por mês. A região Nordeste é a campeã do benefício: 76% dos índios recebem o programa social do governo. O Sul aparece em segundo com 71%; seguido do Centro-Oeste (63%), Norte (56%) e Sudeste (52%).
A pesquisa sobre o perfil indígena feita pelo Datafolha, encomendada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), revela que 64% dos índios são beneficiários do Programa Bolsa Família, recebendo em média R$ 153 por mês. A região Nordeste é a campeã do benefício: 76% dos índios recebem o programa social do governo. O Sul aparece em segundo com 71%; seguido do Centro-Oeste (63%), Norte (56%) e Sudeste (52%).
Mesmo com os benefícios, 36% afirmam ser
insuficiente a quantidade de comida que consomem. A maioria dos índios (76%)
bebe água que não é filtrada nem fervida. As doenças infectocontagiosas atingem
68% e os problemas estomacais, como diarreia e vômito, 45%. Os índios também
afirmam que luz elétrica, água encanada, rede de esgoto e casa de alvenaria são
muito importantes para eles.
Mais de 70% dos índios ouvidos atribuem muita
relevância à atuação da Funai (Fundação Nacional do Índio) na sua aldeia. No
entanto, 39% reprovam o desempenho do órgão, avaliando-o como ruim ou péssimo.
Cesta básica
Quase metade dos entrevistados (46%) relatou receber cesta básica da Funai ou da Funasa (Fundação Nacional da Saúde). Os índios da região Nordeste são os que mais recebem o benefício: 79%. Na região Norte apenas 7% ganham a cesta básica.
Quase metade dos entrevistados (46%) relatou receber cesta básica da Funai ou da Funasa (Fundação Nacional da Saúde). Os índios da região Nordeste são os que mais recebem o benefício: 79%. Na região Norte apenas 7% ganham a cesta básica.
O acesso ao atendimento médico é considerado
difícil por 63% dos índios; 69% deles foram atendidos em postos de saúde dentro
da aldeia e 12% dentro de casa. Eles ainda usam mais os remédios naturais (66%)
do que os farmacêuticos (34%). A maioria dos índios (66%) sabe ler, e 65% sabem
escrever na língua portuguesa. Segundo a pesquisa, 30% exercem trabalho
remunerado, mas somente 7% têm carteira assinada.
A agricultura é exercida por 94%, e 85% praticam a
caça; 57% deles consideram que o tamanho das terras onde vivem é menor do que o
necessário. Os índios também citaram algumas medidas governamentais que
poderiam melhorar a vida dos indígenas no país: intervenções na área da saúde
(25%), demarcação de terras (17%), reconhecimento dos direitos indígenas (16%),
investimentos públicos (15%) e educação (15%).
Procurada anteontem, a Funai afirmou, pela assessoria
de imprensa, que tinha muitas demandas e que não poderia responder às questões
da reportagem até o encerramento desta edição. “A presidente [Marta Azevedo]
está em viagem, sem disponibilidade de agenda. Ela seria a pessoa mais indicada
para comentar a pesquisa”, afirmou, por e-mail.
(…)
(…)
Voltei
Viram só o que o modelo das reservas, que está em expansão (?!), provoca? Uma horda de miseráveis com celular, televisão e DVD. Prega-se a expansão das terras indígenas para que se produza ainda menos em um território maior… Com Raposa Serra do Sol, aconteceu o óbvio: os arrozeiros tiveram de ir embora, deixando atrás de si uma legião de desempregados. Na terra agora sob o controle de caciques ideológicos disfarçados de militantes indígenas, não se produz quase mais nada. Muitos dos índios foram viver como favelados em Boa Vista. A razão é simples: ser indígena não quer dizer ser… índio!
Viram só o que o modelo das reservas, que está em expansão (?!), provoca? Uma horda de miseráveis com celular, televisão e DVD. Prega-se a expansão das terras indígenas para que se produza ainda menos em um território maior… Com Raposa Serra do Sol, aconteceu o óbvio: os arrozeiros tiveram de ir embora, deixando atrás de si uma legião de desempregados. Na terra agora sob o controle de caciques ideológicos disfarçados de militantes indígenas, não se produz quase mais nada. Muitos dos índios foram viver como favelados em Boa Vista. A razão é simples: ser indígena não quer dizer ser… índio!
Leiam este trecho do voto de Ayres Britto (em
vermelho):
(…) III – ter a chance de demonstrar que o seu tradicional habitat ora selvático ora em lavrados ou campos gerais é formador de um patrimônio imaterial que lhes dá uma consciência nativa de mundo e de vida que é de ser aproveitada como um componente da mais atualizada ideia de desenvolvimento, que é o desenvolvimento como um crescer humanizado. Se se prefere, o desenvolvimento não só enquanto categoria econômica ou material, servida pelos mais avançados padrões de ciência, tecnologia e organização racional do trabalho e da produção, como também permeado de valores que são a resultante de uma estrutura de personalidade ou modo pessoal indígena de ser mais obsequioso: a) da ideia de propriedade como um bem mais coletivo que individual; b) do não-enriquecimento pessoal à custa do empobrecimento alheio (inestimável componente ético de que a vida social brasileira tanto carece); c) de uma vida pessoal e familiar com simplicidade ou sem ostentação material e completamente avessa ao desvario consumista dos grandes centros urbanos; d) de um tipo não-predatoriamente competitivo de ocupação de espaços de trabalho, de sorte a desaguar na convergência de ações do mais coletivizado proveito e de uma vida social sem narsísicos desequilíbrios; e) da maximização de potencialidades sensórias que passam a responder pelo conhecimento direto das coisas presentes e pela premonição daquelas que a natureza ainda mantém em estado de germinação; f) de uma postura como que religiosa de respeito, agradecimento e louvor ao meio ambiente de que se retira o próprio sustento material e demais condições de sobrevivência telúrica, a significar a mais fina sintonia com a nossa monumental biodiversidade e mantença de um tipo de equilíbrio ecológico que hoje a Constituição brasileira rotula como “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” (art. 225, caput), além de condição para todo desenvolvimento que mereça o qualificativo de sustentado.
(…) III – ter a chance de demonstrar que o seu tradicional habitat ora selvático ora em lavrados ou campos gerais é formador de um patrimônio imaterial que lhes dá uma consciência nativa de mundo e de vida que é de ser aproveitada como um componente da mais atualizada ideia de desenvolvimento, que é o desenvolvimento como um crescer humanizado. Se se prefere, o desenvolvimento não só enquanto categoria econômica ou material, servida pelos mais avançados padrões de ciência, tecnologia e organização racional do trabalho e da produção, como também permeado de valores que são a resultante de uma estrutura de personalidade ou modo pessoal indígena de ser mais obsequioso: a) da ideia de propriedade como um bem mais coletivo que individual; b) do não-enriquecimento pessoal à custa do empobrecimento alheio (inestimável componente ético de que a vida social brasileira tanto carece); c) de uma vida pessoal e familiar com simplicidade ou sem ostentação material e completamente avessa ao desvario consumista dos grandes centros urbanos; d) de um tipo não-predatoriamente competitivo de ocupação de espaços de trabalho, de sorte a desaguar na convergência de ações do mais coletivizado proveito e de uma vida social sem narsísicos desequilíbrios; e) da maximização de potencialidades sensórias que passam a responder pelo conhecimento direto das coisas presentes e pela premonição daquelas que a natureza ainda mantém em estado de germinação; f) de uma postura como que religiosa de respeito, agradecimento e louvor ao meio ambiente de que se retira o próprio sustento material e demais condições de sobrevivência telúrica, a significar a mais fina sintonia com a nossa monumental biodiversidade e mantença de um tipo de equilíbrio ecológico que hoje a Constituição brasileira rotula como “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” (art. 225, caput), além de condição para todo desenvolvimento que mereça o qualificativo de sustentado.
Encerro
Esse índio acima descrito só existe na cabeça de Ayres Britto, como aqui falei tantas vezes. A tal integração “telúrica” com a natureza é uma fantasia. O desenvolvimento “sustentado” se faz com Bolsa Família e cesta básica — cedidas por nossa civilização tão egoísta…
Esse índio acima descrito só existe na cabeça de Ayres Britto, como aqui falei tantas vezes. A tal integração “telúrica” com a natureza é uma fantasia. O desenvolvimento “sustentado” se faz com Bolsa Família e cesta básica — cedidas por nossa civilização tão egoísta…
Britto transformou os índios em grandes ecologistas,
o que é uma piada até antropológica! Existissem realmente aos milhões, a
Amazônia já seria uma savana. O ministro tem de descobrir que a ideia de
preservação da natureza é um valor desta nossa triste civilização. Não tem nada
a ver com índio, que não louva o meio ambiente nem retira da terra o sustento.
Com as terras de que dispõem, os índios poderiam
estar é produzindo comida para os seus e para muitos outros brasileiros. Em vez
disso, estão na fila do Bolsa Família e da cesta básica.
Por Reinaldo Azevedo