MARINA SILVA, A ECOFALSA, APOIA OS QUADRILHEIROS DO MST.
02/08/2014 às 19:15 \ Política & Cia (Ricardo Setti)
"BADERNA: A cidade de Quedas do Iguaçu, no Paraná, foi praticamente tomada pelo MST. A invasão tem apoio de grupo ligado ao PT. Alguma surpresa?
CIDADE SITIADA
Com o apoio de um grupo ligado ao PT, o MST resolve retomar a invasão de fazendas produtivas. No Paraná, uma indústria pode até encerrar as atividades
As roupas, os carros e as caminhonetes estacionados ao lado das barracas construídas com toras de madeira revelam que o perfil dos militantes do MST que invadiram há duas semanas as terras de uma indústria de reflorestamento no interior do Paraná mudou radicalmente nos últimos anos. É a nova geração de invasores, que usa tênis de marca, tem celular, motos e caminhões para ajudar no trabalho pesado.
Cobertos por lonas novas, mais resistentes do que no passado, os barracos são espaçosos e estão fartamente abastecidos de suprimentos enviados pelas cooperativas ligadas ao movimento. O semblante desenganado dos desafortunados deu lugar a um ar confiante e a um discurso mais arrumado sobre o que eles entendem por reforma agrária. A maioria tem endereço fixo e a lona é nada mais que um ritual de passagem.
A ocupação é o atalho pelo qual muitos filhos de assentados esperam deixar a casa dos pais para construir o próprio patrimônio. Antes inimigos declarados do Estado, que não lhes provia condições dignas de vida no campo, os jovens sem terra agora posam na internet abraçados com lideranças políticas de Brasília. Só uma coisa não mudou: a tática e os métodos criminosos para se apossar de propriedades alheias.
Quedas do Iguaçu é um município de 33 000 habitantes a 447 quilômetros de Curitiba que estrutura sua economia na agricultura, na pecuária e no setor de beneficiamento de madeira, em que se destaca a Araupel, uma das maiores indústrias de reflorestamento da região.
A empresa emprega um quarto da força de trabalho da cidade. Além de gerar 2 000 empregos diretos e indiretos, sustenta toda uma rede de fornecedores que injeta na economia 50 milhões de reais por ano em salários e investimentos, valor equivalente ao próprio orçamento municipal. É a espinha dorsal econômica da cidade. É, também, o alvo principal do MST.
Há duas semanas, 500 sem-terra armados com foices e facões ocuparam um novo pedaço da fazenda da Araupel – que já foi uma das grandes proprietárias de terras da região, com 85 000 hectares de florestas cultivadas no estado. Nas últimas duas décadas, o MST promoveu quatro invasões nas áreas da indústria e conseguiu a desapropriação de 52 000 hectares, criando o maior assentamento da América Latina – mas, segundo os líderes do movimento, ainda insuficiente.
Uma vez assentados, os sem-terra criam os filhos para ser os invasores do amanhã. Desse modo, não importa quantas famílias o governo ampare, sempre haverá novos sem-terra e mais invasões.
Lutando na Justiça para reaver a área, a empresa questiona os reais interesses dos intrusos. “Eles não invadem ao acaso. Escolhem sempre o nosso espaço mais lucrativo, com árvores maduras para o corte. Só a madeira que está nessa área que eles ocuparam vale 100 milhões de reais”, diz o diretor da Araupel Tarso Giacomet.
O coordenador do MST no Paraná, Danilo Ferreira, conhecido como Cabeludo, que lidera essa nova geração de sem-terra, é um exemplo de como a invasão se retroalimenta. Filho de assentado, ele também conseguiu seu lote de terra invadindo a área de reflorestamento da empresa e, agora, está na linha de frente da nova ocupação. Dono de um supermercado que vende produtos aos assentados, ele não esconde um desejo: estrangular a empresa “porque ela exporta para os Estados Unidos”.
“A sobrevivência da Araupel realmente está em risco”, afirma Giacomet. A empresa já conseguiu na Justiça a reintegração de posse, mas os sem-terra se recusam a deixar o local – e ameaçam partir para o confronto.
Às vésperas de uma eleição, o problema deixa de ser policial e ganha contornos políticos. De um lado, o governo do estado, comandado pelo PSDB, quer evitar usar a força por temer que a reintegração de posse venha a produzir um confronto violento com os invasores. Para não provocar estragos na campanha do governador Beto Richa, os mediadores tentam retirar pacificamente as famílias da área.
Do lado do MST, no entanto, está a turma que deseja ver o “bicho pegar”. Cientes das implicações políticas favoráveis ao movimento em plena campanha eleitoral, os sem-terra protegem-se no apoio que recebem de integrantes do PT instalados no governo federal, como o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, e o deputado Dr. Rosinha, que usa o dinheiro das emendas parlamentares para tirar proveito do potencial eleitoral dos assentamentos.
Nos últimos dez anos, os repasses feitos a um conjunto de instituições reconhecidamente controladas pelos sem-terra no país somaram 300 milhões de reais. Já nos assentamentos da região de Quedas do Iguaçu, apenas duas dessas associações receberam 36 milhões de reais. Com os cofres cheios, o MST envolveu a cidade em uma atmosfera de medo.
As autoridades locais evitam criticar os sem-terra porque temem ser alvo de retaliação. Em julho do ano passado, um grupo de 250 sem-terra assumiu o controle do município por um dia inteiro. Descontentes com a qualidade das estradas no assentamento, eles chegaram armados e ocuparam a prefeitura. Depois de expulsar os funcionários, o grupo vandalizou a sede do Executivo.
Meses antes, os sem-terra recorreram ao mesmo expediente para fechar a agência do Banco do Brasil na cidade e, com isso, forçar uma renegociação de dívidas. A população foi impedida de recorrer ao banco por quase uma semana.
Com a nova ocupação nas terras da Araupel, o cinturão de invasões deixa Quedas do Iguaçu cada vez mais sitiada pelos sem-terra. Segundo o presidente da associação comercial da cidade, Reni Felipe, as incertezas sobre os empregos da Araupel derrubaram 60% das vendas no comércio e provocaram a desvalorização de boa parte dos imóveis na região.
A presença do MST também inflou a população, mas não trouxe benefícios econômicos porque muitas famílias vivem exclusivamente da renda de programas sociais, como o Bolsa Família. Sob a condição do anonimato, a dona de um dos principais restaurantes de Quedas diz que o movimento recrutou moradores da própria cidade, interessados em um pedaço de terra fácil.
“Meu garçom, que ganhava 1 100 reais aqui, pediu a conta e está lá acampado agora. Como o governo dá de tudo para essa gente, por que trabalhar, né?”, ironiza ela.
“O MST é uma religião”
O paranaense Danilo Ferreira, 44 anos, é um exemplo de como, ao longo dos anos, as invasões do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) se transformaram num grande negócio. Filho de agricultores sem-terra, ele tinha 14 anos quando os pais foram assentados pela primeira vez. Nos anos 90, foi a vez de ele fazer patrimônio invadindo as terras da empresa Araupel, no entorno de Quedas do Iguaçu. Hoje, Danilo é uma das principais lideranças do MST em seu estado. Conhecido pelo apelido de “Cabeludo” e dono de um supermercado no assentamento, ele prepara a terceira geração de sem-terra.
Qual o objetivo do MST com mais essa invasão?
Nós queremos promover o desenvolvimento econômico das famílias pondo todas as terras improdutivas para produzir. Não dá para se contentar em ser assalariado. Só salário não serve para nada.
Mas as terras invadidas são produtivas.
A nossa discussão de movimento social vai além de pínus e eucalipto. A empresa está no direito dela de produzir celulose, mas em outro lugar. Essas terras são maravilhosas para a agricultura. Se ela quer plantar madeira para exportar para os Estados Unidos, que faça isso em outro lugar.
Há alguma chance de acordo para o MST deixar as terras da empresa?
O pessoal não vai sair, porque nós estamos discutindo um novo jeito de produzir no campo. A nossa lógica é fazer a reforma agrária no Brasil. Estamos retomando as grandes ocupações.
O movimento já não tem terras demais na região?
São 52 000 hectares. As pessoas que estão assentadas hoje, algo em torno de 2 800 famílias, estão no limite. A região não dá mais conta de garantir produção e renda para todos. Temos filhos de assentados que já se casaram, construíram família e agora precisam encontrar um lugar para viver.
O pessoal está preparado para resistir em caso de uma ação policial?
O MST é tipo uma religião. Quem não tem família no acampamento ajuda quem está lá do mesmo jeito. Quem já tem casa no assentamento dá suporte a quem está na barraca. Temos 5 000 pessoas no acampamento e podemos colocar mais 5 000 com dois ou três telefonemas. É só o governador vir com a polícia.
Vocês não temem o confronto?
Temos medo porque existem muitas crianças, mulheres e idosos no acampamento. Mas o pessoal não vai sair. Vai lutar. Se a polícia vier mesmo, ela sabe que vai ter confronto.
Como vocês se organizam?
Temos uns trinta grupos de famílias que se reúnem diariamente. Cada grupo responde a um casal de coordenadores. Temos um grupo de companheiros que atuam na equipe de disciplina e são responsáveis por aplicar o nosso regimento de conduta. Eles são responsáveis pela segurança de todos.
O MST retomou as invasões para pressionar o governo federal?
Não dá para se queixar do governo. Só com uma parte do PAC a gente abriu estradas, construiu casas melhores para os assentados e financiou a produção. Tem muito fazendeiro que, por medo da ocupação, resolveu produzir na terra."