A Pastoral da Juventude, organização católica ligada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), não esconde seus objetivos políticos. Recentemente, publicou uma carta aberta regozijando-se pela reeleição da presidente Dilma Rousseff, "conquistada com muita luta e ação da militância na rua". De acordo com o texto, "o projeto político vencedor representava de forma mais clara a linha de avanços nos campos sociais e na garantia dos direitos, e o projeto popular em curso na América Latina".
Essa posição não deixa de ser um tanto esquisita, tendo em vista ser de uma organização vinculada à Igreja católica. Ao menos em teoria, a Igreja católica se diz apartidária e respeitosa da liberdade política dos seus fiéis. Será preciso estar em sintonia com o "projeto popular em curso na América Latina" para ser católico? É um estreitamento de visão que não se coaduna com a mensagem de liberdade política e de apoio à democracia que a Igreja católica afirma ter abraçado com o Concílio Vaticano II.
O projeto de poder dos autodenominados bolivarianistas - que a Pastoral da Juventude chama de "projeto popular em curso na América Latina" - está longe de ser democrático. O papa João Paulo II, que tanto batalhou pelo fim dos regimes totalitários comunistas, não ficaria muito contente ao ver jovens usando o catolicismo para apoiar regimes que desprezam a liberdade.
A Pastoral da Juventude parece mais preocupada em manifestar alinhamento ideológico com o governo do que com os seus princípios religiosos. A carta aberta agradece os serviços do ex-ministro Gilberto Carvalho, "sempre muito próximo à Pastoral da Juventude". Será que a organização católica ignora, por exemplo, o que a Secretaria-Geral da Presidência da República e o seu braço jovem - a Secretaria Nacional da Juventude - promoveram nos últimos anos?
Os jovens têm ao menos uma desculpa - a de que simplesmente estão seguindo os mais velhos. De fato, não poucas vezes a própria CNBB tem perfilhado versões palacianas dos fatos.
Prova desse perigoso conúbio se deu em agosto do ano passado, antes das eleições presidenciais. O Conselho Permanente Ampliado da CNBB alertou os bispos brasileiros, por meio de sua "análise de conjuntura nacional", a respeito da "sensação de um clima inflacionário espalhado pela mídia". Segundo o documento, "a imprensa não está contribuindo para o debate político-econômico, substituindo a informação pela ideologia da crise permanente. (...) As manchetes dos jornais não param de denunciar erros na política governamental que teriam provocado ondas de desconfiança. A ênfase em dados negativos foi e continua sendo uma característica da mídia nacional". Os analistas da CNBB pareciam se esquecer de que também para eles é imperioso cumprir o mandamento que proíbe a mentira. A simples leitura das contas públicas - compiladas pelo próprio governo - bastava para comprovar que os "analistas" da CNBB estavam desconectados da verdade, mas fortemente alinhados com a ideologia a que servem.
Agora, a CNBB parece dar-se conta de que os desastres administrativos, econômicos e morais apresentados pela imprensa não são invenções - e afetam profundamente a vida social. Com o tema "Fraternidade: Igreja e Sociedade", a campanha da fraternidade de 2015, promovida pela entidade no início da Quaresma, tem entre os objetivos o combate à corrupção. "A corrupção é um grande mal político e social que contraria a fraternidade", afirmou o arcebispo de São Paulo, d. Odilo Scherer, no lançamento da campanha.
Certamente, veio em boa hora esse tema da campanha da CNBB. Segundo o papa Francisco, na sua mensagem de orientação e apoio à campanha brasileira, a Igreja católica pode, respeitando a laicidade do Estado, contribuir efetivamente para o bem comum da sociedade. Um bom começo pode ser relembrar aos jovens católicos e aos "analistas" da CNBB que as ideologias totalitárias e liberticidas são incompatíveis com o espírito cristão.
fonte http://m.estadao.com.br/noticias/opiniao,menos-ideologia-e-mais-coerencia-,1638091,0.htm
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