quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Apenas dois grupos apoiam o ( Des) governo Dilma: os banqueiros e a esquerda.


Encerradas as eleições presidenciais de 2014, poucas pessoas duvidariam que o clima de divisão no país havia se tornado maior do que nunca. Durante meses, o Brasil testemunhou uma máquina de queimar reputações atuar de forma implacável. Projetos? Pouca coisa. Os ataques pessoais deram o tom das campanhas.
Acusações como a de que a candidata Marina Silva entregaria o controle da política econômica aos bancos (exatamente como Dilma viria a fazer meses depois) justamente porque ela, candidata pelo PSB, falava em nome dos banqueiros (apesar de Dilma ter recebido mais do que o dobro em doações de bancos do que ambos os opositores somados), dominaram boa parte do primeiro turno. De ambas as partes acusações de caráter pessoal tomaram conta do cenário. No ápice, o ex-presidente Lula chegou a comparar-se aos judeus sendo perseguido pelos nazistas (do PSDB, no caso), tamanho o ódio que seus adversários possuíam dele. Dividir e conquistar tornou-se um lema de campanha, que pelo lado petista contava com a maestria do marqueteiro João Santana, como Leandro Narloch escreveu para a nossa página à época.

Foi, portanto, bastante espantoso que o ano de 2015 nos levasse ao exato oposto disto. E tudo isso graças à incoerência entre promessas e ações de Dilma – que abandonou seu discurso de campanha e passou a cumprir uma agenda da qual acusara seus candidatos: aumentando juros, cortando direitos trabalhistas e retirando o financiamento de programas sociais. A oposição ao governo por si só foi capaz de unificar aquilo que a manipulação política separou. Cerca de 9 entre cada 10 brasileiros desaprovam o governo, a mais alta rejeição de um presidente na historia.
A rejeição, entretanto, não é unânime: o governo ainda conta com sua base de apoio, cada vez menor, assim como suas opções de ações para mantê-la fiel. Com um ajuste que não é aprovado pelo Congresso – graças à fraqueza política do governo, que não permite a confiança suficiente para eventuais aumentos de impostos – Dilma e Levy falham sucessivamente em realizar o ajuste que propuseram. A perda do grau de investimento pela S&P como se viu há poucos dias, mostrou um limite diante da credulidade de que o governo seja capaz de realizar qualquer mudança.




Iniciado em janeiro com a meta de economizar 1,2% do PIB para pagar os juros da dívida, o ajuste fiscal chegou a setembro com uma meta bem mais modesta que a inicial: agora revisada para 0,15%. Foram aumentos sucessivos de impostos – como a Cide sobre combustíveis, imposto de importação, operações financeiras, lucro dos bancos, PIS/COFINS – além de sucessivos cortes de verba como os R$ 11 bilhões retirados do Ministério da Saúde e os R$ 9,4 bilhões da Educação.
Com o orçamento no limite, o governo viu sua base de apoio diminuir medida após medida. Com a incerteza de que, de fato, receberão os reajustes prometidos ainda na greve de 2012, professores universitários paralisaram suas atividades novamente em mais de 60 instituições de ensino federais no país. Os reajustes prometidos e incertos se transformaram em perda real de salário graças à inflação crescente no país, que atingiu 9,5% nos últimos 12 meses.
Assim como os professores, Dilma perdeu ao longo do ano o apoio de inúmeras organizações tradicionalmente favoráveis ao governo. Em certo ponto, até mesmo seu partido realiza oposição – não diretamente ao governo, mas às medidas de ajuste. O ex-presidente Lula, de olho em 2018 chegou a declarar que “o PT está no volume morto” e que “o partido hoje só pensa em cargo”. As críticas à Dilma tem sido recorrentes na medida em que Lula visualiza risco de contágio à sua imagem.
Sem poder contar sequer com o apoio pleno de seu vice, Michel Temer, que já opôs-se a medidas como a recriação da CPMF e abandonou a tarefa de articular apoio político junto ao Congresso, Dilma chega ao final do ano garantindo apenas que 2016 será tão ou mais penoso que 2015. Refletido no menor nível de confiança do consumidor da história, as perspectivas para o país não são nada animadoras.
Há um setor, porém, que parece imune à crise e que reiteradamente apoia o Planalto: o sistema financeiro. Com exceção dos bancos públicos, o lucro do sistema bancário brasileiro pouco sofreu em 2015. Itaú e Bradesco, os dois maiores bancos privados do país, tiveram no segundo trimestre altas no lucro de 22,1% e 18,4% respectivamente.  O número contrasta com a queda na economia de 1,9%, além do crescimento tímido na carteira de crédito dos bancos de menos de 3% – indicando claramente que o ganho se deu por aumentos em taxas e serviços.






Tendo todas as suas demandas atendidas pelo governo desde o início, o sindicato dos bancos foi o único a lançar nota de apoio às medidas anunciadas nesta segunda-feira, de aumento de impostos e corte de gastos com funcionalismo. A Febraban disse em nota “entender o caráter das medidas”. Meses antes, presidentes de bancos, como Roberto Setubal, do Itaú, e Luiz Carlos Trabuco, do Bradesco, já haviam dado declarações de apoio ao governo e oposição ao processo de impeachment.
Razões para apoiar não faltam. O setor bancário é historicamente ligado a governos ao redor do mundo, em especial no Brasil. O mais regulado dos setores da economia – o sistema financeiro -, que possui um agente central para tabelar preços, limitar concorrência e garantir segurança contra falências – órgão que você conhece como Banco Central -, possui uma história recente no país. Até a década de 1970, as atividades do setor eram bastantes limitadas. Foi justamente com a forte presença do Estado que os bancos brasileiros cresceram.
Ao longo de toda história inflacionária brasileira, os bancos ajudaram a concentrar renda e ampliaram seus lucros na base da inflação. Segundo um estudo dos economistas Mario Henrique Simonsen (ex-Ministro da Fazenda) e Rubens Penha Cysne, no auge do processo inflacionário brasileiro, os bancos chegaram a lucrar mais de 1% do PIB apenas com ganhos inflacionários. Em termos atuais, isto representaria R$ 60 bilhões. Mais do que todo o lucro dos bancos atualmente. E apenas com inflação.
Foi somente no governo Lula, porém, que os bancos se recuperaram do baque que foi a perda das receitas da inflação. Ao longo da década de 1990, inúmeros bancos chegaram a falir em decorrência do fim destas receitas – oriundas graças ao Plano Real. Entre 2002 e 2010, os 9 maiores bancos brasileiros expandiram seus lucros em 550%.




A ideia de que os bancos apoiariam um governo que colocou a economia em recessão pode parecer absurda para muitos, mas é perfeitamente natural quando analisamos os resultados do ajuste fiscal implementado até aqui. Entre janeiro e julho, os gastos do governo com juros somaram R$ 288 bilhões, contra R$ 140 bilhões em igual período do ano passado. O déficit nominal, a diferença entre receitas e despesas totais, superou os 8% nos últimos 12 meses.
O governo em sua fragilidade acatou todas as ordens do mercado financeiro para alcançar a propagada “estabilidade”. O caso tem precedentes históricos. João Goulart, o presidente deposto pelos militares, por muito tempo buscou realizar um ajuste fiscal que acalmasse a economia e permitisse ao presidente governar com tranquilidade para implementar suas ideias. Na Fazenda, Jango colocou ninguém menos do que o fundador do Unibanco, Walhter Moreira Salles. A estratégia como se sabe, não foi bem sucedida.
O recado da Febraban, a Federação Brasileira dos Bancos, deve sempre acender um alerta. Não há dentre os bancos brasileiros, nenhum compromisso explícito que não com o próprio setor. Um dos mais cartelizados da economia, o sistema financeiro nacional (que tem o governo como principal membro e detentor de ao menos metade dos ativos bancários no país), segue desde sempre seus interesses – que em raras ocasiões se alinham aos interesses da população em geral, que trabalha, empreende e tem na liberdade econômica um importante aliado para progredir. Garantir um sistema financeiro menos dependente e ligado ao Estado é portanto um passo importante para o crescimento do país.
E a esquerda nisso tudo? A esquerda brasileira, representada pelas entidades estudantis, sindicatos de trabalhadores e outras organizações do tipo, segue tendo no sistema financeiro um grande opositor. A crítica, porém, limita-se a enquadrar o ministro Joaquim Levy como culpado dos cortes. Toda a crítica à presidente Dilma em si é medida e pesada para que não corra o risco de significar apoio a um processo de impeachment. Em suma, a esquerda se nega a apoiar o impeachment de uma presidente que em sua fragilidade entregou a economia do país aos bancos, com receio de que isto abra espaço para grupos supostamente ligados a banqueiros. É o ápice da lógica que cede lugar à ideologia. Dilma, afinal, faz isso melhor do que ninguém.
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fonte: http://spotniks.com/apenas-dois-grupos-apoiam-o-governo-dilma-os-banqueiros-e-a-esquerda/

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