Vai dizer que você nunca ouviu isso por aí? O discurso é claro: há um golpe em vigor, organizado pela elite econômica do país. Grandes empresários e industriais, descontentes com o governo popular de Dilma Rousseff, tramam um processo ardiloso de impeachment. É uma luta dos ricos contra os defensores dos pobres.
A fórmula está presente de forma repetitiva nas defesas contundentes dos militantes governistas. Mas quanto disso realmente é verdade? Aparentemente, nada.
Alguns dos principais representantes da elite econômica brasileira já marcaram publicamente suas posições em relação ao impeachment de Dilma: são radicalmente contrários. Banqueiros, grandes empresários, donos de grupos de mídia, organizações industriais, todos convergem para o mesmo lugar. Não há possibilidade de um processo de impedimento.
Na lista abaixo, reunimos as figuras e organizações mais influentes do país e suas posições em relação ao impeachment. Ao fim, como diz Roberto Ellery, diretor da Faculdade de Economia da UNB, resta a pergunta: “quantos grandes empresários ainda terão de se manifestar a favor do governo para que alguns percebam de que lado está a elite?”.
1) ROBERTO SETÚBAL, PRESIDENTE DO ITAÚ UNIBANCO
Roberto Setúbal. Talvez você nunca tenha ouvido falar nesse nome, mas provavelmente já cruzou com a fachada de seu empreendimento, presente em milhares de esquinas do país. Roberto é presidente do Itaú Unibanco e membro de uma família com uma fortuna avaliada em mais de US$ 3,3 bilhões. Seu banco é a empresa de maior valor de mercado do Brasil e obteve um crescimento de 29% do lucro líquido no ano passado.
Numa entrevista concedida à Folha nesse final de semana, Roberto foi taxativo: é sumariamente contrário ao impeachment de Dilma Rousseff.
“Nada do que
vi ou ouvi até agora me faz achar que há condições para um impeachment. Por
corrupção, até aqui, não tem cabimento. Não há nenhum sinal de envolvimento
dela com esquemas de corrupção. Pelo contrário, o que a gente vê é que Dilma
permitiu uma investigação total sobre o tema [corrupção na Petrobras]. Era
difícil imaginar no Brasil uma investigação com tanta independência. A Dilma
tem crédito nisso.”
Para o presidente do maior banco privado do hemisfério sul, tampouco as pedaladas fiscais seriam motivo suficiente para o impeachment:
“Isso é grave
e pode merecer algum tipo de punição. Mas não me parece ser motivo para tirar a
presidente. Até porque presidentes anteriores a ela passaram por situações
semelhantes. Seria um artificialismo querer tirar a presidente neste momento.
Criaria uma instabilidade ruim para nossa democracia.”
Apesar da crise, o lucro do Itaú Unibanco no segundo trimestre de 2015 teve um aumento de 22,1% em relação ao mesmo período de 2014.
2) JOÃO ROBERTO MARINHO, VICE-PRESIDENTE DO GRUPO GLOBO
A família Marinho é reconhecidamente a mais rica do país, com uma fortuna avaliada em mais US$28,9 bilhões. Todo esse dinheiro pode ser representado num único símbolo, presente na formação da vida brasileira há cinco décadas: o Grupo Globo.
Como noticia a Folha de São Paulo, João Roberto Marinho, vice-presidente da organização, fez lobby contrário ao impeachment de Dilma nas últimas semanas, reunindo líderes das principais forças políticas do país e integrantes do governo para pedir moderação. Marinho encontrou-se com o vice-presidente Michel Temer, com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) e reservadamente com as bancadas do PT e do PSDB.
Segundo um integrante do governo, o empresário também esteve com Aloizio Mercadante, ministro da Casa Civil, com Edinho Silva, chefe da Secretaria de Comunicação Social e Henrique Alves, ministro do Turismo (que também é dono de uma afiliada da TV Globo no Rio Grande do Norte). Além disso, também esteve com Aécio Neves, Geraldo Alckmin e José Serra, três das principais figuras da oposição.
Para Michel Temer, Marinho pediu uma avaliação sobre as chances do Planalto conseguir recompor sua base no Congresso e questionou os caminhos que o PMDB vê para o país. Reservadamente, o vice-presidente de um dos maiores grupos de mídia do mundo foi categórico: é hora de acalmar os ânimos, conter a crise política e tocar o barco. Com Dilma.
Apesar da crise, o grupo Globo fechou 2014 com um faturamento de R$ 16 bilhões, um crescimento de 9,7% sobre o ano anterior
3) O GLOBO
A posição da família Marinho é sustentada por um editorial publicado há algumas semanas no principal jornal impresso do grupo: O Globo. É dessa forma que o terceiro maior jornal do país anuncia sua posição contrária ao impeachment de Dilma.
“Há momentos
nas crises que impõem a avaliação da importância do que está em jogo. Os fatos
das últimas semanas e, em especial, de quarta-feira, com as evidências do
desmoronamento da já fissurada base parlamentar do governo, indicam que se
chegou a uma bifurcação: vale mais o destino de políticos proeminentes ou a
estabilidade institucional do país?”
O editorial é curto e objetivo: pede o fim imediato da crise política e condições para que a presidente governe. Para O Globo, a oposição ao governo Dilma é “inconsequente”.
“É preciso
entender que a crise política, enquanto corrói a capacidade de governar do
Planalto, turbina a crise econômica, por degradar as expectativas e paralisar o
Executivo. Dessa forma, a nota de risco do Brasil irá mesmo para abaixo do
“grau de investimento”, com todas as implicações previsíveis: redução de
investimentos externos, diretos e para aplicações financeiras; portanto,
maiores desvalorizações cambiais, cujo resultado será novo choque de inflação.
Logo, a recessão tenderá a ser mais longa, bem como, em decorrência, o ciclo de
desemprego e queda de renda. Tudo isso deveria aproximar os políticos
responsáveis de todos os partidos para dar condições de governabilidade ao
Planalto.”
Com tudo isso às claras, vozes ligadas ao PT insistem em dizer que o Grupo Globo defende um “golpe midiático”. Nada que possua qualquer ligação com o mundo real.
4) FIESP E FIRJAN
No último dia 18, o governo federal aplicou um gesto de boa vontade para aproximar ainda mais o Planalto do setor empresarial brasileiro: orientou os bancos públicos a liberar crédito mais barato para empresas de diversos setores da economia. Durante a semana, Dilma pediu apoio explícito num encontro com representantes de alguns dos maiores grupos do país. Participaram da reunião, segundo a lista de presentes divulgada pela Secretaria de Imprensa da Presidência da República: Benjamin Steinbruch, da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), Carlos Fadigas, da Braskem, Carlos Mariani, da PIN Petroquímica, Gunnar Nebelung e Waldemir Loto, da Amaggi, Ingo Plöger, do Conselho Empresarial da América Latina (Ceal), Marco Stefanini, da Stefanini, Paulo Tigre, da DHB Indústria e Comércio LTDA, Pedro Faria, da BRF, Pedro Wongtschowski, da Ultrapar, Ralph Lima Terra, da Abdib e Rubens Ometto, da Cosan.
Poucos dias antes, duas organizações empresariais saíram em apoio à presidente: a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), uma organização que representa 130 mil indústrias, e a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN), que representa 10 mil indústrias.
Numa nota assinada em conjunto, após um pedido de unidade feito por Michel Temer, as duas organizações defenderam que o “momento é de responsabilidade, diálogo e ação para preservar a estabilidade institucional do Brasil”.
“O povo
brasileiro confiou os destinos do país a seus representantes. É hora de colocar
de lado ambições pessoais ou partidárias e mirar o interesse maior do Brasil. É
preciso que estes representantes cumpram seu mais nobre papel – agir em nome
dos que os elegeram para defender pleitos legítimos e fundados no melhor
interesse da Nação.”
“Os
empresários não podem assistir a esse jogo vagabundo, de quinta categoria, da
arquibancada. No fundo (a nota), é um grito para endossar o apoio ao Temer.”
As principais representantes das indústrias do Rio e de São Paulo marcaram suas posições. Sem impeachment.
5) CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA
FIESP e FIRJAN são filiadas à Confederação Nacional da Indústria, a CNI. Há poucos dias, em entrevista para a Folha de São Paulo, Robson Andrade, presidente da organização, também se manifestou contrário ao impeachment:
“Escolhemos em
outubro a liderança que gostaríamos de ter, mas escolhemos em cima de um
programa de governo em que acreditávamos, de gestão, de crescimento. Por uma
série de fatores econômicos e políticos, não se efetivou. Temos agora de ajudar
a construir um país diferente. As instituições têm de ser respeitadas. Foi
eleita, tem de respeitar e ajudar a construir o país dentro do sistema político
que temos, com a liderança que escolhemos. Mas é necessário também que ela tome
as decisões que o país precisa, não podemos ficar à mercê de problemas
políticos.”
Questionado se era a favor do impeachment, foi taxativo:
“Não sou a
favor. Temos mecanismos da Justiça que têm de avaliar essas questões. Não acho
que simplesmente o impeachment resolverá. O que vai resolver é ajudarmos a
construir um Brasil diferente do que temos hoje. Não estou falando que tem de
apoiar a presidente, mas que nós temos de achar um caminho para que nossos
representantes, principalmente o Congresso, aprovem as medidas necessárias. A
eleição da presidente é mais visível, mas, em 2014, as promessas dos candidatos
aos governos, ao Senado e à Câmara, foram as mesmas, de que vão melhorar [o
país]. Estamos esperando por isso e acho que temos de dar as mãos e ajudar a
construir. Se a economia melhorar e o país voltar a crescer, a tendência é que
a [impopularidade] mude completamente.”
Os grupos que representam as maiores indústrias do país têm suas posições bem definidas – a favor do governo.
6) LUIZ CARLOS TRABUCO, PRESIDENTE DO BRADESCO
Luiz Carlos Trabuco, presidente do Bradesco, recusou um convite de Dilma para ser Ministro da Fazenda no final do ano passado – cargo que acabaria ocupado por Joaquim Levy. Hoje, adota um tom apaziguador, apesar de não usar a expressão impeachment. Para ele, é preciso mudar a postura em relação ao Planalto e combater a crise política para gerar governabilidade à Dilma.
“Precisamos
sair desse ciclo do quanto pior, melhor. Melhor para quem? Para o Brasil, não
é. As pessoas precisam ter a grandeza de separar o ego pessoal do que é o
melhor para o país.”
Em entrevista recente ao O Globo, Trabuco manteve a posição de que é preciso diminuir o conflito político.
“Os problemas
econômicos se resolvem, porque são matematização de certas variáveis que podem
ser consertadas. Mas os problemas políticos, não. Eles são de ideias, de
ideologia, de postura. É uma energia usada para provocar calor, e hoje o país
precisa de energia para provocar luz.”
Apesar da crise, o Bradesco teve o maior lucro da sua história no segundo trimestre de 2015, com um aumento de 18,4% do lucro líquido em relação ao mesmo período do ano passado.
7) BANQUEIROS, BANQUEIROS E BANQUEIROS.
A chamada da Folha é triunfante: grandes empresários ainda preferem evitar impeachment de Dilma. E não são os únicos. Os banqueiros, que Dilma apregoava à imagem de Marina Silva nas últimas eleições, também – e Luiz Carlos Trabuco e Roberto Setúbal não são exceções. Há poucos dias, o Ministro da Fazenda se encontrou com alguns deles. Além de Trabuco e Setúbal, participaram da reunião: Alexandre Abreu (Banco do Brasil), Miriam Belchior (Caixa Econômica Federal), André Esteves (BTG Pactual), José de Menezes Berenguer (JPMorgan), Manoel Felix (Indusval/ABBC), Rossano Maranhão (Safra) e Sérgio Agapito Rial (Santander).
Na reunião, Levy apresentou a chamada “Agenda Brasil”, o conjunto de ações e medidas econômicas apresentadas por Renan Calheiros para conter a crise. Segundo aponta a Folha, os banqueiros gostaram.
“O mercado preferiria ficar onde está”, diz o diretor de um banco à coluna de Maria Cristina Frias, na Folha.
Sem crise política. Sem impeachment. Sem “golpe de elite”. Definitivamente, em time que está ganhando não se mexe.
FONTE: http://spotniks.com/7-exemplos-de-como-a-elite-brasileira-e-contraria-ao-impeachment-de-dilma/
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