segunda-feira, 13 de julho de 2015

Foro de São Paulo funda o seu próprio “Pacto de Varsóvia”



Denúncia realizada no plenário da Câmara dos Deputados em Brasília, pelo dep.federal Onyx Lorenzoni sobre a criação do Protocolo de Montevidéu, uma cópia do mesmo modelo utilizado pela URSS com os países do bloco comunista do Leste Europeu. 




O PACTO DE VARSÓVIA DO MERCOSUL

 É preciso estar sempre atento a cada movimento das esquerdas da América Latina. Desde 1990, com o Foro de São Paulo, os movimentos para a conquista e perpetuação de poder são constantes. O bolivarianismo avançou pelo continente, arrasando a economia, pilhando recursos e ameaçando a democracia. Tudo pelo poder 

Aqui no Brasil, o governo petista enviou a Câmara Federal um projeto de decreto legislativo – PDC 1290/2013 – que trata do Protocolo de Montevidéu, uma atualização do Protocolo de Ushuaia de 2001, um acordo de cooperação sobre compromisso democrático no Mercosul. Aparentemente seria um bom projeto, mas o perigo reside nas semelhanças com um outro acordo: o Pacto de Varsóvia. Firmado na Europa oriental em 1955 sob a liderança da extinta União Soviética-URSS, e que acabou, na prática, permitindo aos soviéticos intervirem nos países membros cujas sociedades desejassem se afastar da influência de Moscou e do comunismo. Como exemplos de intervencionismo podemos citar a Hungria, em 1956, onde uma revolta popular anti-comunista foi sufocada pelos soviéticos, a Tchecoslováquia invadida em 1968 durante a “Primavera de Praga” para impedir a abertura política, e em 1981 atuaram na Polônia para sufocar o movimento Solidariedade, liderado pelo sindicalista Lech Walesa que combatia os abusos do governo socialista polonês.
O protocolo de Montevidéu prevê em caso de ruptura democrática, entre outras coisas, o fechamento de fronteiras, suspensão de comércio e corte nas comunicações. Até agora o único país a ratificá-lo foi a bolivariana (COMUNISTA) Venezuela de Chavez e Maduro. Como já ficou provado que o chavismo trata qualquer contestação ao seu projeto de poder como tentativa de ruptura democrática, estaria aberta a perigosa possibilidade de intervenção em qualquer um dos países signatários do Protocolo de Montevidéu. Qualquer ligação com o Foro de São Paulo não é mera coincidência






A República Argentina, a Republica Federativa do Brasil, a Republica do Paraguai, a República Oriental do Uruguai, Estados Partes do MERCOSUL, e o Estado Plurinacional da Bolívia, a Republica do Chile, a Republica da Colômbia, a Republica do Equador, a Republica do Peru e a Republica Bolivariana da Venezuela, Estados Associados do MERCOSUL, doravante as Partes;
CONSIDERANDO que a plena vigência das instituições democráticas e o respeito aos direitos humanos e as liberdades fundamentais são condições essenciais para a vigência e evolução do processo de integração entre as Partes;
REITERANDO o compromisso com a promoção, defesa e proteção da ordem democrática, do estado de direito e suas instituições, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais como condições essenciais e indispensáveis para o desenvolvimento do processo de integração e para,a,participação no MERCOSUL;
ACORDAM:
ARTIGO 1
O presente Protocolo será aplicado em caso de ruptura ou ameaça de ruptura da ordem democrática, de uma violação da ordem constitucional ou de qualquer situação que ponha em risco o legitime exercício do poder e a vigência dos valores e princípios democráticos.
ARTIGO 2
Quando se produzir alguma das situações indicadas no artigo anterior, os Presidentes das Partes ou, na falta destes, os Ministros das Relações Exteriores reunir-se-ão em sessão extraordinária ampliada do Conselho do Mercado Comum, por solicitação da Parte afetada ou de qualquer outra Parte. Tal reunião será realizada no território da Parte em exercício da Presidência Pro Tempore.
Caso a Parte afetada se encontre em exercício da Presidência Pro Tempore, a reunião indicada no parágrafo anterior terá lugar -em principio- no território da Parte a qual corresponda o próximo turno de referida Presidência.
ARTIGO 3
Os Presidentes das Partes ou, na falta destes, os Ministros das Relações Exteriores em sessão ampliada do Conselho do Mercado Comum promoverão, através da Presidência Pro Tempore, consultas imediatas com as autoridades constitucionais da Parte afetada, interporão seus bens ofícios e realizarão gestões diplomáticas para promover o restabelecimento da democracia no país afetado.
Caso as consultas mencionadas resultem infrutíferas ou que as autoridades constitucionais da Parte afetada se vejam impedidas de mantê-las, os Presidentes das demais Partes ou, na falta destes, seus Ministros das Relações Exteriores em sessão ampliada do Conselho do Mercado Comum considerarão a natureza e o alcance das medidas a serem aplicadas de forma consensuada, com base no estabelecido no Artigo 6.
ARTIGO 4
Quando o Governo constitucional de uma Parte considerar que esta ocorrendo em sua jurisdição alguma das situações indicadas no artigo 1 poderá solicitar aos Presidentes das Partes ou, na falta destes, aos Ministros das Relações Exteriores em sessão ampliada do Conselho do Mercado Comum, através da Presidência Pro Tempore, colaboração para o fortalecimento e preservação da institucionalidade democrática.
ARTIGO 5
Com base nos requerimentos do Governo constitucional da Parte afetada e com seu consentimento, os Presidentes das Partes ou, na falta destes, os Ministros das Relações Exteriores em sessão ampliada Conselho do Mercado Comum poderão dispor, dentre outras, a constituição de:
a.- Comissões de apoio, cooperação e assistência técnica e especializada a Parte afetada.
b.- Comissões abertas para acompanhar os trabalhos de mesas de dialogo entre os atores políticos, sociais e econômicos da Parte afetada.
Nas comissões mencionadas nas alíneas a) e b) poderão participar, dentre outros, membros do Parlamento do MERCOSUL, do Parlamento Andino, dos Parlamentos Nacionais, o Alto Representante-Geral do MERCOSUL e representantes governamentais designados pelas Partes para tal fim.
ARTIGO 6
Em caso de ruptura ou ameaça de ruptura da ordem democrática em uma Parte do presente Protocolo, os Presidentes das demais Partes ou, na falta destes, seus Ministros das Relações Exteriores em sessão ampliada do Conselho do Mercado Comum poderão estabelecer, dentre outras, as medidas que se detalham a seguir:
a.- Suspender o direito de participar nos diferentes órgãos da estrutura institucional do MERCOSUL.
b.- Fechar de forma total ou parcial as fronteiras terrestres. Suspender ou limitar o comercio, o trafego aéreo e marítima, as comunicações e o fornecimento de energia, serviços e abastecimento.
c.- Suspender a Parte afetada do gozo dos direitos e benefícios emergentes do Tratado de Assunção e seus Protocolos e dos Acordos de integração celebrados entre as Partes, conforme couber.
d.- Promover a suspensão da Parte afetada no âmbito de outras organizações regionais e internacionais. Promover junto a terceiros países ou grupos de países a suspensão da Parte afetada de direitos e/ou benefícios derivados dos acordos de cooperação dos quais seja parte.
e.- Respaldar os esforços regionais e internacionais, em particular no âmbito das Nações Unidas, encaminhados a resolver e a encontrar uma solução pacifica e democrática para a situação ocorrida na Parte afetada.
f.- Adotar sançoes políticas e diplomáticas adicionais.
As medidas guardarão a devida proporcionalidade com a gravidade da situação existente; não deverão por em risco o bem-estar da população e o gozo efetivo dos direitos humanos e liberdades fundamentais ria Parte afetada; respeitarão a soberania e integridade territorial da Parte afetada, a situação dos países sem litoral marítimo e os tratados vigentes.
ARTIGO 7
Na aplicação das medidas indicadas no Artigo 6, as Presidentes das demais Partes ou, na falta destes, seus Ministros das Relações Exteriores em sessão ampliada do Conselho do Mercado Comum zelarão, através dos meios apropriados, pelo cumprimento pela Parte afetada de suas obrigações no âmbito dos acordos de integração celebrados entre as Partes.
ARTIGO 8
Conjuntamente com a adoção das medidas assinaladas no Artigo 6, os Presidentes das Partes ou, na falta destes, os Ministros das Relações Exteriores em sessão ampliada do Conselho do Mercado Comum interporão seus bons ofícios e realizarão gestões diplomáticas para promover o restabelecimento da ordem democrática e constitucional, o legitimo exercício do poder e a plena vigência dos valores e princípios democráticos no pais afetado. Tais ações serão levadas a cabo em coordenação com aquelas que se realizem em aplicação de outros instrumentos internacionais sobre a defesa da democracia e o respeito aos direitos humanos.
ARTIGO 9
As medidas a que se refere o Artigo 6 aplicadas a Parte afetada entrarão em vigor na data em que se adote a respectiva decisão. As mesmas cessarão a partir da data em que se comunique a Parte afetada a decisão das demais Partes nesse sentido, uma vez que as causas que motivaram sua adoção tenham sido plenamente reparadas.
ARTIGO 10
O presente Protocolo e parte integrante do Tratado de Assunção e dos respectivos
Acordos de integração celebrados entre o MERCOSUL e seus Estados Associados.
ARTIGO 11
O presente Protocolo estará aberto a assinatura das Partes ate 1° de março de 2012.
O presente Protocolo entrara em vigor trinta (30) dias após o deposito do instrumento de ratificação pelo quarto Estado Parte do MERCOSUL. Na mesma data entrara em vigor para os Estados Associados que o tiverem ratificado anteriormente.
Para os Estados Associados que não o t verem ratificado anteriormente a essa data, entrara em vigor no mesmo dia em que for depositado o respectivo instrumento de ratificação.
Os direitos e obrigações derivados do Protocolo somente aplicam-se aos Estados que o tenham ratificado.
Nas matérias reguladas pelo presente Protocolo, as relações entre as Partes que o tenham ratificado e aqueles que ainda não o tiverem ratificado e destes últimos entre si continuarão regendo-se pelo Protocolo de Ushuaia sobre Compromisso Democrático no MERCOSUL, Bolívia e Chile.
Uma vez que todos os Estados signatário (aderentes do Protocolo de Ushuaia sabre Compromisso Democrático no MERCOSUL; Bolívia e Chile, tiverem ratificado o presente Protocolo, o primeiro ficara sem efeitos.
ARTIGO 12
A Republica do Paraguai será Depositaria do presente Protocolo e dos respectivos instrumentos de ratificação, devendo notificar as Partes sabre as datas dos depósitos desses instrumentos e da entrada em vigor do Protocolo, bem como enviar-lhes cópia devidamente autenticada do mesmo.

21 dez 2011 – 00h15
atualizado às 01h25
Os presidentes de Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai firmaram nesta terça-feira o Protocolo de Montevidéu, que prevê uma série de medidas caso algum membro do Bloco ou associado seja alvo de um golpe de Estado.
O Protocolo de Montevidéu “é um mecanismo de resposta quase automática e imediata de defesa da institucionalidade democrática” diante de um eventual “golpe de Estado contra qualquer governo eleito” integrante do Bloco, anunciou o presidente do Uruguai, José Mujica, ao final da Cúpula na capital uruguaia.
O acordo prevê que “em caso de ruptura ou ameaça de ruptura da ordem democrática”, os demais Estados se reunirão para realizar gestões diplomáticas que promovam o restabelecimento da democracia no país afetado.
Mas se estas gestões não derem frutos, poderão ser aplicadas, “de forma consensual”, medidas que vão da suspensão do direito de participar dos órgãos do Mercosul ao fechamento das fronteiras e à paralisação ou limitação “do comércio, tráfego aéreo e marítimo, comunicações e fornecimento de energia”.
O Protocolo prevê ainda a promoção de medidas para suspender o país afetado de outras organizações internacionais e a “adoção de sanções políticas e diplomáticas adicionais”.
O documento estabelece que as medidas “guardarão a devida proporcionalidade com a gravidade da situação existente” e “não deverão colocar em risco o bem-estar da população ou o gozo efetivo dos direitos humanos e das liberdades fundamentais” no país sancionado. O texto destaca ainda que deverá ser “respeitada a soberania e a integridade territorial” de Nação em questão.
Os países poderão firmar o convênio até 1º de março de 2012, e a medida entrará em vigor 30 dias após a data da ratificação pelo último dos Estados membros do Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai). Os Estados associados ao Bloco – Venezuela, Equador, Chile, Peru, Bolívia e Colômbia – poderão aderir posteriormente.
O Mercosul recebeu o pedido formal de ingresso do Equador no Bloco, mas a Venezuela ainda aguarda uma fórmula para permitir sua adesão, bloqueada pelo Parlamento paraguaio.
O presidente José Mujica anunciou a criação de um grupo de trabalho para definir as etapas que Quito deve cumprir visando seu pleno ingresso no Mercosul. A equipe deverá apresentar ao Conselho Mercado Comum os resultados de suas análises no prazo de 180 dias.
O caso da Venezuela permanece parado, após fracassar a proposta uruguaia para uma “fórmula jurídica” visando superar o impasse no Parlamento paraguaio, que se nega a ratificar o ingresso de Caracas no Bloco.
A presidente Dilma Rousseff pediu “um esforço maior” para a incorporação da Venezuela, firmada em 2006 em nível presidencial, mas bloqueada pelo Paraguai, cujo Parlamento é dominado pela oposição ao presidente Fernando Lugo.
Os mandatários anunciaram a criação de um “Grupo de Diálogo de Alto Nível para promover a incorporação de novos membros plenos ao bloco regional”, assegurando que isto constitui “um passo fundamental para a consolidação do Mercosul e para o fortalecimento do processo de integração da América do Sul”.
“Incorporemos ao Mercosul mais países da América do Sul do porte e da importância da Venezuela”, destacou Dilma Rousseff, afirmando que “este processo de ampliação só nos fortalece”.
Na área econômica, o Bloco decidiu elevar transitoriamente as alíquotas sobre as importações de produtos de fora do Mercosul “acima da Tarifa Externa Comum”.
“Está autorizado aos Estados membros (…) elevar, de forma transitória, as alíquotas do imposto de importação acima da Tarifa Externa Comum (AEC) para produtos de fora do Bloco”. A medida visa a mitigar “desequilíbrios comerciais derivados da conjuntura econômica internacional”.
O Mercosul também firmou um tratado de livre comércio com o Estado Palestino, o que constitui o primeiro acordo comercial entre os palestinos e países da América do Sul.
“Esperamos que (os países do Mercosul) possam nos ajudar a acabar com o sofrimento do povo palestino e a levar adiante um acordo de paz entre Palestina e Israel”, destacou o chanceler palestino, Riyad Al Maliki
Brasil, Argentina e Uruguai decidiram ainda bloquear a presença de barcos com bandeira das Ilhas Malvinas em seus portos, e emitiram uma declaração afirmando que os três países adotarão “todas as medidas necessárias (…) para impedir tal ingresso…”.
O texto destaca que as embarcações rejeitadas por este motivo em algum porto da região “não poderão solicitar a entrada em outros portos dos demais membros do Mercosul ou de Estados associados…”.
Além de Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, o Mercosul tem como Estados associados Equador, Peru, Colômbia e Chile, enquanto a Venezuela está em processo de plena adesão.
A Cúpula do Mercosul foi marcada por dois incidentes envolvendo a Argentina, o aparente suicídio do subsecretário de Comércio, Ivan Heyn, em um hotel de Montevidéu, e a intervenção judicial na sede da operadora de TV a cabo Cablevisión , do grupo Clarín, que enfrenta a presidente Kirchner.
Iván Heyn, 33 anos, que participava da Cúpula do Mercosul, enforcou-se, aparentemente, em um hotel do centro da capital uruguaia, e a notícia abalou claramente Cristina Kirchner. Heyn era economista e líder do grupo juventude peronista La Cámpora, do qual participa Máximo Kirchner, filho mais velho da presidente argentina.
Em Buenos Aires, a polícia ocupou a sede da Cablevisión , por determinação do juiz federal Walter Bento, da província de Mendoza, por denúncia de “exercício presumível de concorrência desleal” e “posição dominante”.
A operação foi “considerada sem precedentes, inscrevendo-se numa campanha sistemática de perseguição que o Governo Nacional realiza contra as empresas do Grupo Clarín”, afirmou a Cablevisión em comunicado.
Escrito por Lindolpho Cademartori | 22 Setembro 2004
Arquivo
Na Europa pós-1945, os soviéticos utilizaram os Estados nacionais centro e leste europeus para justificar a busca do triunfo ideológico do socialismo sobre o capitalismo.
Introdução
A bibliografia em língua portuguesa relacionada à análise dos trinta e cinco anos de existência do Pacto de Varsóvia (1955-1990) é, qual bem sabe-se, escassa: com freqüência os estudiosos do assunto vêem-se na contingência de buscar informações em trabalhos estrangeiros,  manuais genéricos, tratados de história militar, obras vinculadas ao pensamento estratégico vigente à época da Guerra Fria ou fontes que pecam pela superficialidade e pelas incursões no senso comum. Os trabalhos fundamentais na respectiva seara estão disponíveis, em sua maioria,  nos idiomas inglês, francês e alemão; curiosamente, acadêmicos e funcionários governamentais dos países da extinta Cortina de Ferro ainda se ocupam majoritariamente da análise dos documentos oficiais da Organização, cuja íntegra ainda não foi devidamente explorada. Nesse sentido, faz-se mister a dívida do presente ensaio para com as obras de Rottmann (Warsaw Pact Ground Forces),  Simon (Warsaw Pact forces: problems of command and control), Remington (The Warsaw Pact:  Case studies in Communist conflict resolution), Jones (Soviet Influence in Eastern Europe: Political autonomy and the Warsaw Pact), Meissner (Der Warschauer Pakt) e Gumpel (Comecon und Warschauer Pakt), entre outros. Procurou-se restringir a gama bibliográfica às obras que tivessem como cerne o próprio Pacto de Varsóvia, mercê do que se prescindiu de obras que trabalharam o pensamento estratégico soviético de forma geral e deliberada; tampouco nos dedicamos à análise dos detalhes de natureza técnico-militar ou que trabalhassem, isoladamente, as políticas externa ou doméstica dos Estados-membro da organização (exceção parcial feita à União Soviética). Em virtude da brevidade do ensaio, priorizamos os aspectos gerais e as observações político-estratégicas em conjunto, assim como suas conseqüências no relativo equilíbrio de poder entre as forças do Pacto de Varsóvia e as da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).
Como fonte bibliográfica primária – e, dir-se-á, indispensável -, utilizamos os arquivos do Parallel History Project on NATO and the Warsaw Pact[1],  projeto salutar desenvolvido pelo International Security Network (ISN), vinculado ao Centro de Estudos sobre Segurança da Eidgenössische Technische Höchschule Zürich. O projeto, coordenado pelo Prof. Vojtech Mastny, tem como escopo uma análise comparada e evolutiva das estruturas operacionais e da formulação do pensamento estratégico do Pacto de Varsóvia e da OTAN. Conseqüentemente, este ensaio terá orientação eminentemente acadêmica, concentrando-se na desconstrução direta de algumas acepções comuns/vulgares a respeito da aliança militar comunista, priorizando as circunstâncias que levaram à formação da organização, a análise de seu tratado constitutivo, sua extensão estratégica ativa, sua estrutura institucional e operacional, sua posição na ordem internacional e seu desaparecimento decorrente da derrocada do bloco socialista no Leste Europeu.  Não negligenciaremos, sem embargo, abordagens comparativas entre os postulados doutrinais do Pacto de Varsóvia e da OTAN, o semi-monopólio exercido pela U.R.S.S. no âmbito deliberativo da aliança e os princípios que  teriam orientado os países da aliança comunista em caso de guerra contra as potências da OTAN em solo europeu, entre outros tópicos.
Leitmotiv: Remilitarização da Alemanha Ocidental ou expressão positiva do projeto expansionista soviético?
A sabedoria convencional sustenta, via de regra, duas razões – em certa medida excludentes – que foram decisivas para a formação do Pacto de Varsóvia: o surgimento da OTAN, em abril de 1949, e a decisão ocidental (precipuamente anglo-americana, deve-se frisar) de proceder com a remilitarização e integração à aliança ocidental da República Federal da Alemanha (Alemanha Ocidental). Ambos os argumentos são facilmente desconstruídos: se a União Soviética pretendia ombrear as forças ocidentais formalizadas na OTAN através do Pacto de Varsóvia, porque o intervalo de seis anos para que se constituísse a aliança militar comunista? Quanto à premissa da remilitarização alemã, resta pacífico que a mesma foi articulada como uma resposta ao aumento do build-up militar soviético na República Democrática Alemã (Alemanha Oriental). Contemplemos os entremeios e as razões pouco sugeridas.
A criação da OTAN não despertou em Stálin o ensejo de formar com os países-satélites da U.R.S.S. uma contraparte formal à aliança ocidental.  A índole prática do ditador soviético, quase um fetichismo político por concertações ad hoc,  o preveniram de tal iniciativa; ademais, os acordos bilaterais com a Polônia, a Hungria e a Tchecoslováquia, somados ao inexpressivo desenvolvimento militar desses países após 1945 e à absoluta preponderância da máquina de guerra soviética sobre as capacidades militares dos demais países do bloco comunista, também operavam no sentido de afastá-lo de tal iniciativa. Se a OTAN surgiu como uma resposta enfática do Ocidente à inflexibilidade soviética demonstrada no Bloqueio de Berlim Ocidental, a divisão formal da Alemanha em dois Estados e a eclosão do conflito na península coreana deveriam ter apresentado razões suficientes para, havendo interesse – ainda que hesitante – por parte de Stálin, a formalização de uma aliança militar comunista. Moscou, com efeito, não “tomou” o conflito coreano, digamos, como uma “ofensa pessoal”, donde deriva que Stálin preferiu (como um tertius gaudens, nas palavras de Aron[2]) assistir ao embate de chineses e norte-americanos, ao passo que supria com armamentos as forças maoístas e se a proveitava da negligência dos E.U.A. na Europa através da dissimulação, falseando uma suposta “indignação soviética” perante a exclusão da República Popular da China da ONU (nomeadamente do Conselho de Segurança) e consolidando seu poder absoluto sobre os satélites soviéticos no Leste Europeu. É imperioso reconhecer que, no referido âmbito, os soviéticos agiram com maestria: utilizaram o boicote ao CSNU como uma “isca” para captar a atenção do Ocidente e fingiram-se extremamente preocupados com o conflito na península coreana, enquanto o Ocidente relaxava os esforços políticos na Europa Oriental e os soviéticos estabeleciam seu poder inconteste até o Oder. A guerra que se desenrolava nas adjacências do paralelo 38 sempre foi secundária para o Kremlin, mas quando os governos ocidentais se inteiraram das circunstâncias, as divisões soviéticas já haviam adentrado Berlim Oriental para lembrar aos rebeldes alemães orientais a “solidaridade socialista” que estes pareciam haver esquecido.
A revolta popular ocorrida em Berlim Oriental – pioneira na contestação das ditaduras socialistas e no enfrentamento à hegemonia soviética -, que atingiu seu ápice em 17 de junho de 1953[3], pôs termo à distração ocidental. A supressão do movimento por forças soviéticas e alemãs representou, simultaneamente, a consolidação do poder do Kremlin sobre a Alemanha Oriental e o espanto das potências ocidentais. A difusão, no Ocidente, de fotos do levante alemão, motivou pronunciamentos enérgicos por parte de Eisenhower e Churchill; Moscou, ainda no esteio do vácuo de poder gerado pela morte de Stálin, evitou a retórica e concentrou suas ações no escopo prático. Como forma de arrefecer o retorno das atenções da OTAN para o “problema alemão”, a diplomacia soviética retomou a ardilosa proposta de Stálin que sugeria a “neutralização” da Alemanha (a exemplo do que ocorreria com a Áustria, pelo State Treaty de 1955, cuja neutralidade o Pacto de Vasóvia jamais cogitou respeitar em caso de guerra com o Ocidente) como instrumento da reunificação. O reavivar da idéia, contudo, afigorou-se não só breve como retórico, vez que conquanto preconizava a neutralização da Alemanha, os soviéticos prosseguiram a passos largos com o aumento de suas forças militares na Europa Oriental, superando oitenta divisões terrestres por volta de 1955.
Nesse mesmo ano, Moscou abandonou definitivamente a possibilidade de uma Alemanha neutra. Reagindo ao vigoroso aumento da máquina de guerra soviética no Leste Europeu, as potências ocidentais concluíram os Tratados de Paris e deliberaram, junto à Alemanha de Konrad Adenauer, pela integração da República Federal à OTAN. Reemulando o (farsesco) temor de Stálin em relação a uma “renazificação” da Alemanha, os soviéticos fizeram uso de sua propaganda para qualificar o rearmamento da Alemanha Ocidental como uma “renazificação” (ou “remilitarização”, ou ainda “reprussificação”) patrocinada pelas potências capitalistas. Conceberam, para tanto, a criação de um blefe, em um dos mais bem-sucedidos embustes da diplomacia soviética: o Pacto de Varsóvia.
O Kremlin necessitava de uma blindagem: a morte de Stálin e o lento expurgo das barbáries stalinistas por parte do PCUS estavam começando a azedar as relações sino-soviéticas; a perspectiva de que as potências ocidentais não entregariam a Áustria ao bel-prazer soviético; a praticamente assegurada neutralidade finlandesa; a indisfarçável descoordenação política decorrente da morte de Stálin; o retorno das atenções ocidentais à Europa – todos esses fatores agravavam a posição soviética. A remilitarização da Alemanha Ocidental, longe de representar uma ameaça, oferecia um trunfo aos soviéticos: uma justicativa para amalgamar sete países sob seu comando militar direto, através de uma aliança formal cuja única divisão atributiva se referia aos prejuízos de uma eventual guerra. Nesse sentido, as palavras de Vojtech Mastny parecem investidas de razão: a criação do Pacto de Varsóvia foi menos uma decisão militarmente motivada do que uma manobra política.[4] Intermediariamente importante, poder-se-ia imprimir mais disciplina e coesão estratégica às forças militares dos países da Cortina de Ferro, e, mais importante, dividir-se-ia os prejuízos políticos, econômicos e militares de uma guerra contra o Ocidente: ao invés de Moscou, São Petersburgo, Kiev e Volgogrado, as nações “imperialistas” poupariam as duas últimas para lançar suas bombas sobre, diga-se, Budapeste e Varsóvia.
O fundamento político, bem entendido, resta na intenção soviética de se “igualar” – quiçá juridicamente, ou na aspiração de erigir uma aliança formal e institucionalizada –  às potências ocidentais por meio de uma estrutura institucional semelhante à da OTAN. Ainda que os ganhos militares de tal aliança fossem inicialmente ínfimos, daria a Moscou o controle prático direto sobre as forças militares dos países da aliança, através dos célebres “acordos de cooperação militar”, e, por fim, resultaria na expressão positiva do projeto expansionista soviético, através do estabelecimento do poder inconteste e do rechaçar incondicional de qualquer ingerência ocidental nos países do bloco socialista.
Não é de todo insensato, portanto, a conclusão – tão mais realista quando se procede com a análise dos declassified documents da aliança – de que o Pacto de Varsóvia representou um blefe político tão exitoso quanto as engenhosidades retóricas e diplomáticas utilzadas por Frederico, O Grande, na Guerra dos Sete Anos. Com a ressalva distintiva de que, em 1955, os soviéticos detinham a upper hand militar, o que apenas contribui para caracterizar a aliança como um ardil político instrumentalizado como um display positivo do expansionismo soviético no Leste Europeu. Em 1956, ter-se-ia a prova de fogo, e a entrada dos blindados russos em Budapeste, combinada à pouco expressiva reação ocidental á repressão soviética à revolta húngara, legitimou inexoravelmente a hegemonia vermelha a leste do Oder.
Tanques, mentiras e lágrimas de crocodilo
Laconismos à parte, os soviéticos, na condição de esmerados propagandistas, eram inigualáveis na arte da retórica hilária e no diletantismo pedante. Souberam, pois, como transplantar suas habilidades para o texto do Tratado de Amizade, Cooperação e Assistência Mútua[5], ata constitutiva do Pacto de Varsóvia. Em um texto legal prolixo que esclarece pouco – se não nada – sobre a aliança, a diplomacia soviética desfiou petardos alarmistas, reafirmou seu “compromisso com a paz”,  fez referências diretas à remilitarização da Alemanha Ocidental, definiu-se e a seus satélites como “peaceloving states”, condenou a aliança atlântica e, deslocando-se com intimidade no palavrório de bravatas, disse estar o “Tratado de Amizade, Cooperação e Assistência Mútua” aberto à adesão de todos os países que assim o desejassem, “independente de seus sistemas sociais” “(Art. 9), e, em uma conclamação, chamava as nações “amantes da paz” a se juntarem à “família” socialista.
A relação do Estado soviético com a propaganda é originária. E.H. Carr, brilhante historiador britânico conhecido por suas embasadas críticas aos liberais e por sua tímida simpatia pelo marxismo, afirma que “A iniciativa de introduzir a propaganda como um instrumento normal das relações internacionais deve ser creditada ao governo soviético.” [6]. Em seguida,  Carr diz que as causas disso foram parcialmente acidentais, o que é de pouca importância para o presente ensaio. O governo soviético fez uso sistemático da propaganda nas relações internacionais porque carecia de força militar e econômica no plano internacional; para equilibrarem a situação, precisavam de domínio sobre a opinião pública. As críticas das nações democráticas ao governo soviético são, nesse sentido, imaturas e hipócritas: não só a propaganda pder ser considerada uma “arma branca” nas relações internacionais, como também o Ocidente, após a difusão do panfletarismo propagandístico nas relações internacionais,  a utilizou abundantemente. O que de fato perfaz um demérito para os soviéticos é o fato de terem lançado mão da propaganda em um tratado internacional, apelando para a vulgaridade em um espectro em que o formalismo é não apenas instrumento como também essência. A segunda cláusula pré-ambulatória do Tratado de Amizade afirma, ipsis litteris, que a lavratura dos Tratados de Paris e a integração da Alemanha Ocidental à OTAN “aumenta o risco de uma nova guerra e ameaça a segurança nacional das nações amantes da paz”; no retromencionado Art. 9 do Tratado, há uma convocação velada para que todos os países, “independente de seus sistemas políticos”, integrem a aliança; o Art. 11 prevê o fim da vigência do Tratado quando a lavratura de um tal “Tratado Geral Europeu” tiver sido atingida.  A exemplo da arregimentação dos terceiro-mundistas nos fóruns multilaterais após a Conferência de Bandung, a diplomacia soviética  se empenhou em bradar a exploração do “imperialismo” e em denunciar os “crimes” das potências capitalistas ao invés de apresentar razões fáticas que justificassem a formação de uma aliança militar para conter a “iminente invasão” da aliança atlântica, que, diga-se, não foi considerada antes da década de 1960. O posterior fascínio que o paternalismo estratégico soviético exerceu no emergente Terceiro Mundo e nos nacionalismos afro-asiáticos nascentes foi contrastado com a compreensão límpida que as potências ocidentais tinham a respeito do Pacto de Varsóvia: a aliança era, tout court, um expediente dissuasivo de que os soviéticos haviam se valido para escamotear a consolidação definitiva de seu projeto expansionista no Leste Europeu. A fragilidade sintética de seu tratado constitutivo, as fundamentações legais extremamente tradicionalistas inspiradas no Art. 51 da Carta das Nações Unidas e a insignifância inicial do auxílio militar dos países da Cortina de Ferro corroboram tal argumentação. As lágrimas de indignação vertidas por Moscou ante a remilitarização da Alemanha Ocidental foram, acima de tudo, o pranto de um crocodilo imperialista que concatenou as manobras políticas para tal desidério com um senso prático que, embora estrategicamente brihante, passa ao largo das razões (defensivamente plausíveis) sobre as quais se formou a aliança militar ocidental.
Os padrões constantes na estratégia soviética e a função do Pacto de Varsóvia
Cumpre expor, às circunstâncias, os princípios gerais da estratégia do Pacto de Varsóvia, que, qual já previamente exposto, se confundem com as prioridades estratégicas da União Soviética[7].
1) O Pacto de Varsóvia evoluiu do status de uma aliança militar formal, concebida para se contrapor à OTAN na Europa, para a condição de instrumento estratégico soviético com o propósito de fazer a guerra na Europa;
2) A União Soviética jamais pôde se certificar da eficiência militar do Pacto, vez que a prioridade de seus satélites eram, em larga escala, conflitantes e nacionalmente calculadas, o que era demonstrado nas reuniões do Estado-Maior da aliança;
3) A função estratégico-militar do Pacto de Varsóvia foi, desde sua gênese, ofuscada, em função da inflexível ideologização da aliança. Como conseqüência, sua faceta militar foi relegada a um plano secundário, e seu caráter político aflorou diante de seus oponentes. Gradativamente, os membros da OTAN constatavam que a aliança comunista era mais uma ferramenta de coesão dos soviéticos do que um bloco militar compacto;
4) A partir da segunda metade da Guerra Fria, o Pacto de Varsóvia conferiu mais atenção à ameaça chinesa à U.R.S.S. do que os observadores ocidentais puderam, à época, constatar. O teatro europeu foi, por um ínterim, secundário, e uma ação mais vigorosa por parte do Ocidente poderia ter minado os pilares da aliança comunista;
5) Malgrato o framework institucional da OTAN ter servido de parâmetro para o Pacto de Varsóvia, a aliança liderada pelos soviéticos jamais logrou atingir a nível de parceria coesa da aliança atlântica, mercê do que a OTAN se converteu em um dos pilares do sistema de segurança europeu após a Guerra Fria;
6)&n bsp;Diferentemente da OTAN, a União Soviética não permitiu aos membros do Pacto de Varsóvia desenvolver uma doutrina militar conjunta, assim como não esclareceu a diferença entre as competências do Alto Comando soviético e as dos comandos militares dos países-satélites;
7)Nos anos derradeiros da Guerra Fria, os membros do Pacto de Varsóvia pretenderam, inicialmente, operar uma transformação na aliança, de modo a assemelhá-la à OTAN. Tal mudança, porém, provou-se estrutural e operacionalmente impossível, tendo a extinção da organização ocorrido mais em função de suas assimetrias e fraquezas internas do que de pressões externas.
Com efeito, o caráter critico do ensaio não nos faculta perpassar os trinta e cinco anos do Pacto de Varsóvia e fazer uma leitura específica de todos os postulados estratégicos da aliança. Com o declassifying progressivo dos arquivos, dispomos, até agora, dos War Plans desenvolvidos em 1964 e 1965[8], respectivamente pelo Ministério da Defesa da Tchecoslováquia e da Hungria. Mesmo em retrospecto, as perspectiva são tanto assombrosas quanto equivocadas: consta do Suplemento N° 8[9] do Exército Popular da Hungria, parte do War Plan de 1965, que Viena, Munique, Verona e Vicenza deveriam ser completamente destruídas por mísseis nucleares SS-20, sendo alvos primários dos ataques. Retoricamente, o plano – talvez a título de justificativa moral perante os próprios pares – trabalhava com a hipótese de que os “ocidentais” estariam urdindo um plano de ataque contra os Estados do Pacto de Varsóvia, e, portanto, o ataque preventivo afigurava-se plenamente justificável – assim como, no entender dos comunistas, era justificável ignorar a neutralidade austríaca, com a escusa cretina de que os ocidentais fariam o mesmo, e assim transformar Viena em um imenso deserto nuclear alvejado por duas ogivas de 500 quilotons.
Por outro lado, os estrategistas da aliança comunista eram taticamente anacrônicos: pretendiam travar uma guerra com a OTAN utilizando-se de preceitos táticos empregadas na Segunda Guerra Mundial. Um plano militar elaborado pelo Estado-Maior polonês em 1956 previa, como que em um delírio estratégico, um desembarque  de forças polonesas na Dinamarca[10], concomitante a uma ofensiva maciça do Pacto de Varsóvia às concentrações de forças ocidentais na Alemanha Ocidental, com bombardeios nucleares sobre Hamburgo, Bremen,  Brunswick, Hannover, Roskilde, e Ebsjerg[11]. Singularmente curiosa é a linguagem utilizada pelos poloneses: pretendiam os homens do General Jaruzelski “libertar” a Dinamarca[12].
O desembarque de forças polonesas na Dinamarca integrava o front Norte. No front central,  esquadrões táticos soviéticos e tchecoslovacos se encarregariam de bombardear o QG do 7º Exército norte-americano nas proximidades de Stuttgart, sudoeste da Alemanha, e divisões blindadas e de infantaria tchecoslovacas rasgariam a Bavária e o o sudoeste do território alemão, irrompendo a fronteira francesa e avançando até Dijon, contando com apoio de divisões aerotransportadas soviéticas e o estancamento do front sul através da colocação da Áustria hors de combat e da invasão da Itália por tropas húngaras e soviéticas. Trata-se – resta nítido – de uma concepção estratégica que nos remete às táticas alemãs e soviéticas na II Guerra Mundial. O bloco socialista contemplava, ainda, o emprego de forças terrestres em pleno fall-out nuclear, posterior aos ataques nucleares sobre a Europa e a marcha de tais forças em ambientes radioativos. Trabalhavam, assim, com um quociente de baixas elevado, estimados em 2 a 4 milhões de soldados.
As orientações estratégicas vigentes no Pacto de Varsóvia de 1955 a 1968 se esgotaram com o advento de novas armas, novos padrões de ataque tático, penetração de colunas blindadas e, enfim, pela superioridade área incontestável da OTAN. Se a revolta húngara de 1956 havia suscitado temores nas lideranças soviéticas quanto à autonomia operacional das forças militares nos países-satélites, a Doutrina Brezhnev que chancelou a “Assistência Fraternal” aos tchecoslovacos em 1968 – representada por dóceis tanques de trinta toneladas e por bem-intencionadas deportações de “subversivos” tchecoslovacos para campos de trabalhos forçados na U.R.S.S. – consagrou a verdade de que Moscou não permitiria aos demais membros da aliança o desenvolvimento de uma doutrina militar conjunta. Em agosto de 1961, durante a segunda crise de Berlim, a movimentação de divisões alemãs-orientais, soviéticas e tchecoslovacas na Europa Central era intensa; quatro divisões blindadas soviéticas se perfilaram no Passo Fulda (Fulda Gap), ameaçando romper a fronteira entre as duas Alemanhas, e as forças da OTAN na Alemanha Ocidental foram pegas no contrapé; MiG´s soviéticos sobrevoaram a Alemanha Ocidental, submarinos norte-americanos invadiram o mar territorial soviético; soldados e tanques postavam-se frente a frente no Checkpoint Charlie, na fronteira entre Berlim Ocidental e Berlim Oriental; ergueu-se o muro e arrefeceu-se a tensão; os soviéticos recuaram suas divisões blindadas para trás do Passo Fulda e se comprometeram a não invadir Berlim Ocidental. O conflito havia sido, uma vez mais,  dispersado no cume do tempo crítico.
Após a crise de Berlim, os soviéticos concluíram que a estratégia de pressão e das ameaças de oceanos de tanques atravessando o Passo Fulda e esmagando a Alemanha Ocidental funcionava, bem como uma companhia de blindados nas proximidades do Muro, em Berlim, quando quer que uma atitude ocidental desagradasse ao Kremlin. Isso foi, ao menos, o que chegou ao conhecimento das potências ocidentais nos idos da Guerra Fria, pois que dificilmente se ventilaria a hipótese absurda e delirante de forças tchecoslovacas marchando sobre a Alemanha e chegando à França, ou soldados poloneses desembarcando em Copenhagen e ocupando Hamburgo (como se a RFA estivesse completamente desguarnecida e as forças da OTAN na Europa fossem meros expedientes fantasiosos).
A estratégia comunista era, lato sensu,  megalômana e majoritariamente impraticável. Tratavam o fator da escalada nuclear como uma variável que manipulavam sem critérios rígidos, e virtualmente ignoravam a supremacia naval dos E.U.A. no Mediterrâneo e a “ponte” logística que se estenderia dos Estados Unidos à Grã-Bretanha no momen to mesmo em que o perigo de guerra se demonstrasse factível.
A década de 1970 assistiu ao esgotamento progressivo da capacidade econômica soviética decorrente dos fracassos agrícolas de Brezhnev, das secas na Ucrânia e na Ásia Central e dos índices improdutivos da indústria pesada. Mui previsivelmente, o reflexo de tal declínio foi sentido no plano militar, que pôde ser cautelosamente preterido em razão da ressaca moral norte-americana em função do malogro no Vietnã e pelo viés de baixa nas economias capitalistas provocado pelas crises do petróleo (1973 e 1979). Os anos 70 pareciam prenunciar um lento Untergang da Guerra Fria e um entendimento relativo das duas superpotências: aos analistas de então, as rivalidades bipolares se acomodariam e americanos e soviéticos conviveriam em uma ordem estável, adornada por cooperações setoriais e pela certeza de que uma guerra entre ambos resultaria em custos com os quais nenhuma das partes estava disposta a arcar. Os acordos SALT, o desaquecimento do ímpeto estratégico norte-americano, a fragilidade doméstica norte-americana do período Nixon-Ford e a mediocridade da administração de Jimmy Carter , entre outros fatores, contribuiriam para reforçar essa compreensão.
Desmanchando no ar
No natal de 1979, a União Soviética deu início sua longa derrocada de doze anos. A invasão do Afeganistão não tardaria se traduzir em um fracasso militar de proporções morais dantescas, e o Alto Comando soviético menoscabou suas conseqüências no âmbito político doméstico e do próprio bloco socialista. A expansão das dissensões políticas no Leste Europeu –  que não resvalava espaço a uma reestruturação do Pacto de Varsóvia enquanto a mesma ainda era viável -, somado às pressões separatistas-nacionalistas nos Países Bálticos e nas repúblicas soviéticas centro-asiáticas se juntariam à atmosfera de agonia. A eleição de Ronald Reagan nos Estados Unidos, o “reaquecimento” da Guerra Fria, a hostilização paradigmática-propagandista de Reagan ao denominar a U.R.S.S. “Império do Mal” e a Iniciativa de Defesa Estratégica norte-americana perfizeram uma aposta que o blefe soviético não foi capaz de cobrir, e Reagan logrou levar o orçamento soviético à exaustão com o Projeto Guerra nas Estrelas.
Para erigir um projeto similar ao Guerra nas Estrelas, a U.R.S.S. precisaria dispor de 38% de seu orçamento, quadro improvável para um establishment militar atolado nas montanhas afegãs[13] e para um país que vinha colecionando fracassos econômicos nos últimos quinze anos. O recuo nos mecanismos de cooperação bilaterais foram arduamente sentidos por Moscou e pelos satélites no Leste Europeu, o que deu azo ao surgimento de movimentos como o Solidarnosc polonês e o manifestantes de Leipzig. Discordâncias logísticas e estratégicas e declarações contraditórias sobre a campanha no Afeganistão  eram explícitas na própria hierarquia do Exército Vermelho, e conspirações políticas e conchavos militares se tornariam uma constante no cotidiano soviético. Em terminologia ampla, o Estado soviético estava falido; as reformas propostas por Gorbachev apenas içaram o Kremlin para baixo, como uma força gravitacional irresistível, e de 1985 em diante a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas caiu como um descomunal meteoro desorientado. A perda de controle sobre os países do Leste Europeu foi simultânea à humilhante retirada soviética do Afeganistão; em 1989 a Áustria escancarava sua fronteira com a Hungria e não havia um único linha-dura no Kremlin que considerasse seriamente a hipótese de fechá-la com a força dos tanques soviéticos.  Em novembro do mesmo ano, o Muro caiu, Ceaucescu foi fuzilado e o Pacto de Varsóvia agonizava. Num espetáculo paradoxalmente catártico e pacífico, o Império Soviético desmoronava sobre as próprias bases carcomidas pelas podridões da burocracia, da ineficiência e do autoritarismo político, em um continuum que colocava o socialismo, junto ao fascismo, no basket case da História. A dissolução do Pacto de Varsóvia em maio de 1990 suprimia definitivamente a possibilidade de se modernizar a organização e assemelhá-la à estrutura organizacional da OTAN. Dezenove meses depois – exatos doze anos após a invasão ao Afeganistão –, era a própria União das Repúblicas Socialistas Soviéticas que cessava de existir.
A última grande ameaça européia
Caso o leitor se preste a fazer uma análise cronológica da História européia desde o início da Idade Moderna, haverá de concluir que, de uma forma ou de outra, o Velho Continente esteve constantemente ameaçado por aspirações hegemônicas coletivistas, sejam elas de inspiração religiosa, nacionalista ou ideológica. No século XVI e na primeira metade do século XVII, nada se resolvia na Cristandade sem que os Habsburgo ou os Bourbon tivessem envolvido; no século XVIII a Europa era como uma sala de jogos em que Silésias, Saxônias, Tiróis, Pomerânias e Boêmias estavam disponíveis para o tour de fource das potências; entre 1795 e 1815, o continente vergou-se aos exércitos revolucionários de Napoleão; de 1890 a 1914-18, a Alemanha guilhermina assombrou o mundo com sua diplomacia agressiva e sua propensão hegemônica; entre 1933 e 1945, foi a vez do nacional-socialismo emular as vocações coletivistas das eras precedentes e compor um credo ideológico-racial, com o qual pretendeu converter a Europa em um imenso hinterland do IIIReich; de 1945 a 1989, os soviéticos fizeram do comunismo sua bandeira de conquista e arregimentaram, sob seu domínio direto, sete nações (sem computarmos os Países Bálticos) centro e leste européias, soerguendo um império europeu que, em contraste com todos os demais, veio a pique sem a necessidade de um conflito armado e encerrou por desmoronar sobre as próprias bases. A constatação que se extrai desse decurso é a de que as grande ameaças dirigidas à Europa, ainda que tenham vindo do próprio continente, destoam explicitamente do pensamento político que, desde a Antigüidade Clássica ou a partir do fim do século XVII, distinguiram o Ocidente de todas as demais civilizações. O imperium dos Habsburgo era um construto  dinástico-reli gioso; o de Napoleão, uma concepção nacionalista-ideológica; o de Guilherme II, nacionalista; o de Hitler, nacionalista-racial; o de Stálin e seus sucessores, ideológico.
O Liberalismo clássico inglês foi a única filosofia política que não desenvolveu uma política hegemônica européia, e mesmo sua expansão imperialista pelo globo ocorreu, segundo Hans Morgenthau[14], em um “momento de distração”.  A razão pela qual o liberalismo não era propício ao florescimento das aspirações hegemônicas/imperialistas radica fundamentalmente em seu primado sobre o indivíduo, considerado sempre a unidade ética por excelência. Ainda de acordo com Morgenthau[15],  os  principais fomentos da política externa hegemônica  são a insegurança pessoal, o baixo grau de coesão social e a necessidade do indivíduo insatisfeito sublimar suas frustrações através do esplendor da glória coletiva da Nação. Trata-se, enfim, de um escape. As justificativas não se esgotam aí, mas essa nos parece ser a melhor para utilizarmos nesse trabalho. Como o liberalismo sempre tem o indivíduo como prioridade e lhe reconhece ampla liberdade de ação em tudo aquilo que a si só disser respeito, os povos de cultura política mais desenvolvida – como os anglo-saxões e os escandinavos – acabam atingindo, na esfera de cada indivíduo, os objetivos a que se propuseram, e, portanto, alcaçam um nível satisfatório de tranqüilidade. Logo, não há necessidade de se extravasar as frustrações individuais e a baixa coesão social através de uma política externa agressiva, donde concluímos a moderação natural dos povos democráticos e liberais. Outros povos – germânicos, eslavos, latinos, árabes, orientais, etc. – por terem, historicamente, uma cultura política distinta e mais focada na coletividade do que no indivíduo, têm assim mais dificuldade em assimilar, orgânica e naturalmente, a democracia e o liberalismo, de modo que freqüentemente cedem às tentações coletivistas e aos romantismos abstratos, que extravasam as frustrações dos indivíduos através de uma expansão imperalista/hegemônica.
O Pacto de Varsóvia representou a última das grandes ameaças européias. Diante da obsolescência do Estado nacional na Europa pós-1945, os soviéticos não tentaram ressuscitar os nacionalismos: eles utilizaram os Estados nacionais da Europa Central e Oriental como uma justificativa para se alcançar o triunfo ideológico do socialismo sobre o capitalismo. Ocorre que o socialismo, assim como o nacionalismo, é uma filosofia política coletivista; diferem apenas em sua escala e em seus métodos. Em contraste com os arranjos supranacionais e a cooperação da Europa ocidental, viabilizados a partir da Comunidade Européia do Carvão e do Aço (CECA) e da Comunidade Econômica Européia (CEE), os soviéticos propuseram uma estrutura imperial que abertamente professava a superação do capitalismo e a “união dos povos”, enquanto na prática emulava o secular imperialismo russo em suas diversas roupagens. Fracassaram não por causa do triunfo da democracia ou da relativa renúncia européia à política de poder, mas pela irracionalidade e incompetência de seu próprio sistema. Se aos saudosistas é lamentável observar que, desde 1989, a Europa é um Éden pós-histórico, é necessário também frisar que para o europeu mediano o padrão de vida, a tranqüilidade e a satisfação individual é muito superior em 2004 do que era em 1914 ou 1934. Perderam a política de poder e as glórias estratégicas, para que triunfassem as aspirações do indivíduo comum. Os liberais – ao menos os liberais-internacionalistas – têm o que comemorar: a Europa se livrou dos coletivismos inflamados para, enfim, atingir a maioridade. Lá os homens são todos irmãos e a Alegria vive em Bruxelas
Notas:
Notas:
[1] Todos os arquivos do projeto, desenvolvido por acadêmicos e funcionários dos Estados envolvidos, estão disponíveis no
 website do Parallel History Project on NATO and the Warsaw Pact A República Imperial: Os Estados Unidos e o Mundo, 1945-1973. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.





[12] MÜNGER, Christof. “Wie Polen Dänemark ‘befreit’ hätte”. In  “Tages Anzeiger”: 17/01/2003. Disponível em A política entre as nações: a luta pelo poder e pela paz. Brasília: Edunb, IPRI, 2003. pp. 99-102.


fonte:  http://radiovox.org/2015/06/07/foro-de-sao-paulo-funda-o-seu-proprio-pacto-de-varsovia/#sthash.GaJkhNr6.dpuf

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